Uma parte da geração nascida depois do boom econômico do século XX, diz que viver na Coreia atual é como viver em um “inferno”.
Quais os efeitos que cultura dos anos em que a Coreia viveu o denominado “Milagre do rio han” têm na juventude do século XXI, a ponto dessa geração ser chamada de “a geração que é obrigada a desistir”?
Não é novidade para nenhuma pessoa minimamente familiarizada com a cultura, o fato de que a Coreia é uma sociedade rígida.
Mas o que se destacou para mim ao longo desses anos lendo sobre o país, foram esses diversos termos ligados à juventude na Coreia. Afinal, por mais que as coisas aqui nas terras brasileiras não estejam fáceis, a gente não tem tantos termos específicos para definir uma geração sufocada.
O conceito de “Hell Joseon” se refere a diversos desafios que a juventude sul-coreana enfrenta para atingir o ideal de sucesso da sociedade.
Pessoas na internet contam que é um sentimento de “estar preso” em uma economia na qual apenas poucos conseguem ser bem-sucedidos, constituir famílias e viver vidas confortáveis.
Como a cultura coreana chegou nesse sistema?
Como citado na abertura, a Coreia passou por um desenvolvimento gigantesco depois dos anos 60, até pouco antes da quebra da bolsa de Hong Kong em 97. Esse momento é chamado de “Milagre do Rio Han”, em homenagem ao rio mais importante do país.
Esse “milagre” foi estruturado em 3 pilares que marcam a mentalidade e funcionamento da Coreia até hoje: Educação, Industrialização e Urbanização.
Se você é fã de algum grupo de k-pop conhecido por suas músicas chicletes, seu grupo provavelmente teve alguma de suas música banidas durante a época do Suneung, a prova para ingressar na faculdade.
O país literalmente para. Tudo pela concentração dos estudantes durante esse teste.
O Suneung é o equivalente a um ENEM, com questões de todas as disciplinas. Esse exame é extremamente importante, especialmente quando se lembra que a competição para entrar nas três maiores universidades do país é um enorme determinante para o futuro.
Muito do progresso absurdo da Coreia no século XX é ligado à educação. A visão de pessoas bem educadas carrega esse peso social em um país que viu seu sucesso em “capital humano”. Esse pensamento que veio junto com as gerações passadas, criou esse sistema de competição entre os mais novos, um loop de pressões para se destacar, que no final… ninguém realmente se destaca
Esse sistema criou uma realidade em que 39% dos estudantes já tiveram pensamentos sérios sobre suicidio por causa de questões acadêmicas.
Mas é “só” se formar nas melhores faculdades e o emprego vai tá fácil né?
Lee Jin-Yong. estudante de engenharia mecânica em uma das três maiores universidades do país, a Yonsei university, disse em entrevista ao CNA insider:
“Eu me esforcei tanto e superei a pressão para entrar nessa universidade, e agora que estou me formando, não tenho para onde ir…é frustrante”
Atualmente, 21% dos jovens entre 25 e 29 na coreia estão desempregados, a maior porcentagem dos países desenvolvidos.
Esse número continua crescendo já faz alguns anos, e mesmo com cerca de 70% da população jovem atendendo à universidade, a cada ano menos pessoas decidem seguir a educação após o ensino médio.
A universidade já não é uma segurança de que o indivíduo vá conseguir um emprego após a graduação, por isso, a população mais pobre que não pode arcar com o custo do diploma, desiste de ir para a universidade para evitar o débito estudantil.
A discussão sobre hell joseon se encontra muito com a questão de diferenças sociais e privilégio daqueles que nasceram em berços de ouro. A diferença de oportunidades que as pessoas tiveram ao longo da vida.
“Há uma descriminação baseada em educação e há descriminação nos empregos e, não importa o quanto você tente, são poucas as chances de subir nas classes sociais” conta o trabalhador manual Lee Cheung-Yeup para o CNA insider.
Não é apenas da faculdade que a população coreana teve que abrir mão. Tem até um termo sobre isso: Geração Sampo.
Sam em “três” em coreano e Po do verbo “pogihada” que significa desistir.
Esse termo se refere às três coisas que a juventude sul-coreana teve que abrir mão por causa dos crescentes problemas econômicos e pressões sociais:
Relacionamentos, casamentos e crianças.
Com o tempo, esse termo foi adaptado para “N-po” para demonstrar as inúmeras coisas que os jovens tiveram que desistir, como casa própria, saúde e até sonhos são citados.
O ideal de casamento é extremamente importante dentro da sociedade coreana, já que essa possui muitos valores confucionistas. Entretanto, a “solteirice” virou uma característica da geração, uma vez que o casamento traz em si mais coisas que devem ser abandonadas, em uma realidade em que já se abre mão de muitas coisas. Aqueles que escolhem evitar a pressão do casamento são chamados de “bihon”.
Mais pessoas escolhem viver sozinhas, com 40% das casas sendo compostas por apenas 1 pessoa. Esse afastamento de relacionamentos e poucos casamentos levaram a Coreia ao crescimento demográfico negativo no ano de 2020. Isso é uma tendência mundial, mas é interessante trazer o contexto social na Coreia sobre o caso.
Cada geração traz consigo seus desafios e a missão de viver num mundo deixado pelas gerações anteriores. É importante que a juventude se junte, lute pelos seus ideias e não deixar que o peso dos adultos a impeça de viver o mundo do seu jeito.
