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Crianças de Guerra: Adoção e a salvação ocidental

A maior agência de notícias da Coreia, a Yonhap News, em parceria com a Agência Nacional de Proteção a Criança (NCPA), lançou uma campanha para que crianças adotadas e levadas para o exterior encontrem suas famílias biológicas. Desde os anos 50, foram mais de 200 mil “coreaninhos” espalhados pelo mundo por meio da adoção.

Mas por que a Coreia virou um país tão popular para aqueles que buscam a adoção internacional?

Na matéria de hoje, a que vos fala vai explicar o porquê de ter tanta criança coreana pelo mundo e como isso conversa com o conceito do “salvador branco”

O ocidente

A diáspora coreana nos EUA contabiliza cerca de 1/3 do número total de adoções desde a guerra da Coreia e é por lá que se pode apontar o começo da história.

A “febre de adoção de bebês asiáticos” é creditada para o casal Holt, que logo após a guerra da Coreia, adotou 8 crianças coreanas e as levou para Oregon. 

Essa “febre” foi tão grande que a lei para adoção foi alterada e retirou as cláusulas–racistas– que limitavam as imigrações de países asiáticos. A “Holt Bill” foi aprovada em outubro de 1955, e na época a narrativa de “heróis salvadores de pobres órfãos” era a imagem que a Holt international (que, até hoje, é uma das maiores agências de adoção dos EUA) passava aos possíveis adotantes, como se as crianças eram “sortudas por terem sidos salvas da pobreza e miséria”. 

Desde a divisão da península em 53, o governo da Coreia do Sul contabilizou cerca de 170 mil crianças adotadas, mas a maioria dos especialistas coloca esse número na casa dos 200 mil.

Foi só na Coreia?

Também na ásia, nos anos 70, o Vietnã passou por seu conflito devastador da guerra fria. Em 1975, a  “Operação Babylift” alocou mais de 3,300 crianças vietnamitas para famílias ocidentais nos EUA, Austrália e Europa. Assim como no caso Holt e a Coreia, a operação também foi pintada como algo humanitário.

O pesquisador Joshua Forkert aponta que a decisão da Austrália de aderir à operação babylift foi uma influência não só doméstica como internacional, ao invés de contabilizar como apenas uma extensão de qualquer lei de adoção. 

“A contestação política para decência e compaixão durante os últimos dias da guerra do Vietnam viu a operação como uma oportunidade do governo de amenizar as pressões políticas e fugir das acusações de que a Austrália estava mais preocupada com ‘uma cesta de gatinhos a refugiados vietnamitas’, mas que seu desejo de ser bem vista pela comunidade internacional fez com que as decisões do governo violasse diversas leis de adoção”

Acontece é que várias dessas crianças não eram órfãs, e foram arrancadas de suas famílias para a imagem pública dos EUA após uma guerra sangrenta.

Assim como no Vietnam, a primeira “leva” de adoções nos anos pós guerra da Coreia uma parte das crianças eram órfãs, mas muitas foram levadas por serem “mistas”, normalmente filhos de mulheres coreanas com militares brancos e negros que lutaram na guerra, e por conta de suas acestralidades não seriam bem aceitos na sociedade da península.

As seguintes ondas de adoção eram de crianças que vieram de diversos outros contextos, como crianças perdidas. Muitos desses ‘pequenos’ foram vítimas do fracasso do Estado, que não sabia organizar planejamento familiar, incentiva o estigma contra mães solteiras e, com suas políticas caóticas e misóginas, viu essa oportunidade de enviar crianças para longe como forma de “resolver” problemas de superpopulação.

E como ficaram as crianças?

Mesmo com o número gigante de adoções, eles não são classificados como seus tradicionais “Gyopos” –crianças nascidas de família coreana em outros países– uma vez que essas crianças adotadas não são mais consideradas coreanas.

A diferença da diáspora que cresceu em famílias coreanas para a diáspora que foi adotada por famílias de outras etnias é que essas crianças coreanas foram tiradas totalmente de suas culturas, com o próprio governo coreano os negando como cidadãos 

Antropóloga Elena Kim aponta que os asiáticos sempre foram considerados uma minoria flexível, que se adapta bem a qualquer outra etnia. Pode-se apontar bem essa visão da comunidade ocidental quando em 1972, a Associação Nacional de Assistentes Sociais Negros condenou a adoção transracial de crianças negras por pais brancos como “genocidio cultural”

Em anos recentes, assim como citado na abertura do texto, os –agora– adultos adotados estão voltando para a Coreia para tentar se reconectar com um passado que, muitas vezes, os foi arrancado, e agora tentam curar seus traumas.

“Todos nós sofremos com racismo internalizado e às vezes com o racismo dentro de nossas famílias, com isso, nós sabemos que existe uma predisposição para problemas mentais.”, terapeuta especializado em adoções transraciais e também coreano que foi adotado nos EUA, Moses Farrow conta.

Os últimos números sobre a adoção estrangeira na Coreia apontam que essa prática está na queda pelo terceiro ano seguido, e, curiosamente, também mostra que 99,5% das ultimas adoções foram feitas por pessoas solteiras em outros países.

Atualmente, os grupos de adotados se juntam por meio da internet e criam redes de apoio pelo mundo inteiro, se ajudando a navegar seus sentimentos e histórias.

Fontes: (1), (2), (3), (4), (5), (6)

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