Ser fã de conteúdos de fora do país tem suas vantagens, como a exposição a uma nova cultura e novas visões artísticas… Mas também tem suas dificuldades, e é aí que entra uma parte essencial na composição de um fandom: fanbases e fansubs.
A que vos fala fez algumas perguntas para algumas fanbases e fansub para conhecer um pouquinho de quem presta um papel tão importante.
Para começar, é importante saber a organização: como cada um lida com a carga de trabalho. Acompanhar o fluxo de conteúdo que o k-pop e a indústria asiática gera é um trabalho que requer um acompanhamento dedicado.
‘’O modo como o artista é ativo nas redes sociais, o tipo de conteúdo que o fandom mais gosta e o tamanho e disponibilidade da equipe são os principais fatores a se considerar ao organizar a equipe de uma fanbase[…] Há diversas maneiras de fazer essa divisão de responsabilidades na equipe e cabe à fanbase descobrir qual funciona melhor para as três partes: o artista, a equipe e o fandom.” conta a Victon Brasil.
A Day6 Brazil segue uma divisão bem comum de conteúdos: “A equipe geral é separada em subdivisões, onde as habilidades de cada membro se encaixam melhor, então tem os administradores gerais, a equipe de traduções simples, que fica encarregada de informações mais breves e atualização de redes sociais, além de fazer as interações e postagens que não necessitam de proficiência em outro idioma; outra equipe é responsável pelas traduções de artigos e matérias mais complexas, programas de rádio, TV e lives; e uma equipe responsável pelas mensagens do Bubble e atualizações dos membros no Twitter. Através dessa organização, a gente consegue ter uma boa frequência de postagens, e os horários não ficam descobertos”
E é perceptível que a dinâmica muda muito em comparação com o porte de cada conta. Por exemplo, a Jamie Brasil contou: “Somos muito comunicativas e todo mundo toma iniciativa, então não tem muito que ficar cobrando nem nada. Quando alguém acha alguma coisa ou quer fazer algo já se dispõe e se compromete a isso e quando é algo que dividimos nós conversamos e estipulamos prazos e dá tudo certo”. Já a Magic Fansub conta com uma estrutura igual de uma empresa: Tem o Conselho de Administração/Fundação, a gerência, as divisões que também são divididas em setores.
Ok, equipe organizada. Como fãs, nós sabemos que os conteúdos vêm de diversas fontes, então como cada página dá seus jeitos de juntar tudo?
O “network” que os jornalistas usam para conseguir suas fontes, vale para organizar e conseguir os conteúdos também. A experiência de compartilhar informações é algo coletivo em todas as áreas.
“Para encontrar conteúdo nós pesquisamos as hashtags dela, os marcados no instagram, as fontes oficiais como a agenda e conta de staff. É basicamente pesquisar, com o passar do tempo vai se aprimorando e aprendendo. Vendo por onde é mais fácil e prático.” Como a Jamie Brasil conta, e a Day6 Brazil tem um esquema parecido:
“A fanbase trabalha com uma lista de contas que sempre postam atualizações, charts e tradução coreano-inglês sobre a banda, e a partir das postagens dessas contas, os integrantes das subdivisões filtram o que é relevante para ser postado e o que não é. A fanbase trabalha com esse esquema de listas de fontes há muitos anos, e é um mecanismo que funciona bem.”
Ah, e se você também tem curiosidade para saber como os fansubs conseguem os episódios dos seus doramas favoritos, a Magic revelou que há sites globais que disponibilizam os vídeos para todo o mundo de forma gratuita.
Tá, agora temos os conteúdos…é só traduzir e postar, né?
A tradução é uma das partes fundamentais de quem compartilha conteúdo asiático.
A Nct Brasil, que lida com 23 membros e 6 línguas, conta: “A tradução de artigos é sempre um desafio porque no NCT existe um fluxo muito grande de entrevistas principalmente em época de comeback! Ou em momentos extraordinários como o NCT 2020, em que todos os integrantes se juntam. Sempre tentamos traduzir tudo com qualidade e atenção pois muitos termos precisam de traduções bem específicas, felizmente a maioria das entrevistas são traduzidas para o inglês, então podemos traduzir com mais foco“
Mas tem uma coisinha…
A Victon Brasil diz: “Encontrar e compartilhar conteúdo pode ser mais complicado do que parece, pois a maioria desses conteúdos passam por duas traduções (kr-ing e ing-pt) e é importante se atentar e não deixar nada perdido ou sem contexto nesse processo.”
E a Day6 Brazil também comentou algo do tipo:
“Por ser uma fanbase de banda, muitas vezes os conteúdos sobre música necessitam uma contextualização maior, ou uma explicação sobre termos técnicos e específicos da área, e isso geralmente é feito pelos próprios membros da fanbase que têm conhecimento musical”
O papel de uma fanbase e de um fansub é não somente traduzir palavras, mas também culturas e realidades que a maior parte do público não conhecia antes.
“A equipe de tradução filtra quais artigos vão ser traduzidos e divide entre os tradutores, mas eles sempre pedem uma segunda opinião na revisão da tradução, principalmente quando o assunto tem um teor mais sério, pra não acontecer nenhum erro de tradução que possa mudar o sentido de uma frase a acabar acarretando problemas ou mal-entendidos.” diz a Day6 Brazil
A Update Kgirls conta sua experiência com essa parte do trabalho: “A tradução no início foi um grande problema, eu era só como ADM e confiava em traduções de contas de fãs não-brasileiras do Twitter e traduzia pelo Google e isso trouxe diversos problemas para UK. Com o tempo eu fui pesquisando melhor minhas fontes, estudando melhor o inglês. Ainda não estou fluente no Inglês, e estou bem longe disso, mas mantenho todo cuidado na hora de traduzir para não distorcer as informações.”
A que vos fala é tradutora de coreano e, realmente, é muito difícil a tradução em uma língua que não é nossa, mas é extremamente gratificante . A Victon Brasil fala sobre esse sentimento: “Apesar de ser trabalhoso, pessoalmente, é uma das coisas que mais gosto de fazer pois, aprendo muito sobre meus favs com esse processo e gosto de saber que estou proporcionando acesso a esse conteúdo para outros do fandom.”
Essas contas não só ajudam a democratizar esse conteúdo estrangeiro que dificilmente chega no país, mas também ajuda a espalhar e atrair mais pessoas para os fandoms, e familiarizar o público geral, já que muitas vezes os posts saem da bolha k-popper.
“A importância da fanbase para a comunidade seria mesmo para introduzir a Jamie ao público brasileiro. Particularmente, achamos que a direção musical dela é bem recebida pelos fãs brasileiros, então acreditamos que a fanbase pode ser importante nesse sentido: aumentar o fandom dela internacionalmente” conta a Jamie Brasil
A Nct Brasil comenta: “As fanbases têm uma importância enorme na aproximação dos fãs com os artistas, vai muito além da tradução. É um lugar onde você pode interagir sempre se sentindo acolhido e por dentro dos conteúdos. Acredito que sem as fanbases muitos conteúdos seriam perdidos ou nem chegariam aqui então eu acho que temos um papel muito importante na globalização da cultura coreana e, claro, fazemos isso sem pretensão e com muito carinho”
“As fanbases fazem os conteúdos do artista mais acessível ao fandom e isso é de extrema importância. Além disso, são comumente um dos fatores avaliados na hora de uma produtora decidir fazer ou não um evento com o artista, levando em consideração o engajamento das fanbases. Isso é algo que sempre digo: é de extrema importância apoiar as fanbases dos seus artistas favoritos, não só para valorizar nosso trabalho voluntário, mas para abrir portas para o artista!” disse a Victon Brasil.
“Acreditamos que temos um papel bastante importante na comunidade, já que somos um das principais formas de acesso aos conteúdos asiáticos de forma gratuita e legendada em português.” conta a Magic Fansub. (um beijo para todos os fansubs, sério!)
Uma colaboradora em um fansub comenta sobre o assunto da democratização:
“No meu ponto de vista, os fansubs são essenciais para a democratização do acesso às produções asiáticas, visto que plataformas e aplicativos como Netflix, Viki ou WeTv nem sempre são alternativas viáveis para o público consumidor. Visto isso, acredito que esteja atrelado com o próximo tópico, pois o acesso às produções acaba por difundir as culturas não só da Coreia, mas também do Japão, China, Tailândia e Taiwan, por exemplo, e isso é ótimo e importante por vários motivos: por diversificar e introduzir diferentes produções no cenário do cinema mundial (que levou a vitória de Parasite no Oscar de 2020), por incentivar discussões acerca da xenofobia, racismo e da visão orientalista e eurocêntrica cujo esses países e suas populações são alvo, além do não menos importante aumento do repertório cultural.”
“A fanbase desempenha um papel fundamental ao facilitar o acesso às informações sobre os artistas para as pessoas que não entendem outras línguas, e filtra as informações importantes e pertinentes sobre os artistas.” conta a Day6 Brazil.
E como pessoas que compartilham informações, também entra o critério ético:
Continuando a fala da Day6 Brazil: “Aí entra a parte da responsabilidade, de saber usar os critérios do que é importante para ser divulgado, e principalmente a forma como vai ser divulgado. As fanbases desempenham quase que um papel de fonte oficial, por isso as informações devem ser dadas de forma responsável, sempre de forma impessoal e jamais evidenciando posicionamentos pessoais ou suposições de membros da fanbase — quando necessário, a fanbase deve fazer um posicionamento como página, e não a opinião de uma ou duas pessoas da equipe […] As fanbases precisam ter consciência da função que desempenham de representar uma equipe séria de informações sobre determinado artista no país, e assumir a responsabilidade de informar da maneira correta as pessoas que acompanham a fanbase”
A Victon Brasil comenta neste assunto: “Definitivamente a parte mais difícil de administrar uma fanbase é lidar com os escândalos. Enquanto o fandom surta, a fanbase está tentando manter a calma, indo atrás de fontes confiáveis e de toda contextualização do problema, para então escrever um texto explicando o que e porque aquilo está acontecendo. O profissionalismo, imparcialidade e empatia são de extrema importância no momento de explicar o acontecido, o motivo de alguns dizerem que foi errado e o porquê outros estão defendendo, deixando o fã decidir de qual lado ele ficará, sempre respeitando sua escolha independente de suas opiniões pessoais.
Obviamente há exceções onde a imparcialidade deve ser deixada de lado e a empatia deve ser o fator principal. Como um portal com certo alcance, quando o contexto permite e requer, a fanbase deve tomar um lado, nunca se calando (“passando pano”) ou defendendo discursos de ódio e/ou ataques, deixando claro seu posicionamento.”
De fã em fã estamos compartilhando conteúdos e arte incríveis. O crescimento do consumo de produções asiáticas aumentou muito! A Fundação Coreana revelou que há uma estimativa de 89,19 milhões de fãs da cultura coreana em todo o mundo, isso em 2018 e desde de lá, muita coisa mudou.
A Update Kgirls conta:“Tudo vem crescendo de forma absurda por aqui, não só no meio musical, os doramas estão sendo cada vez mais consumidos e isso é perceptível. Nós percebemos o crescimento conforme nossa conta cresce junto. Pessoas novas, com dúvidas sobre tudo e com aquele olhar mágico de algo novo, sabe? É algo gratificante ver esse crescimento. Nós seguimos dando nosso melhor para ajudar nesse crescimento na UK! Amamos ver!”
“Com a ascensão do k-pop pelo mundo, achamos que a descoberta dos elementos culturais asiáticos não ficariam de fora, somos um grande consumidor de dramas e música asiática, um dos elementos mais importante é a diversidade de conteúdo, tem para todo gosto, de dramas e filmes românticos a ficção científica, um universo variado” conta a Magic Fansub.
A Jamie Brasil diz: “Acreditamos que agora as pessoas estão se sentindo mais abertas a escutarem artistas coreanos com menos pré- julgamento e estereótipos de antes. Por mais que ainda tenha muita gente que continue com esses pré julgamentos, atualmente conseguimos ouvir artistas coreanos em rádios locais, lojas, trends em redes sociais… É mais difuso. É legal ver que esse crescimento abre portas para visibilidade de estilos musicais de outros países que realmente são bons. Já que o público está mais disposto a ouvir. Quando vemos o crescimento de um estilo musical ficamos mais esperançosos de que isso seja uma abertura para um “mercado cultural” mais diverso.”
Deu para perceber o trabalho que dá ser de fanbase e fansub. No final das contas: Como são as experiências? Vale a pena?
A Victon Brasil diz ”Como fanbase, tudo que fazemos é pelo fandom, então ter um feedback deles é muito importante para sabermos se há algo que precise mudar ou algo que devemos fazer mais… não tem nada que nos deixe mais feliz do que saber que estamos fazendo um bom trabalho para o fandom. Receber alguma mensagem nos elogiando ou agradecendo sempre faz nosso dia, nós apreciamos muito isso e é o que nos motiva a continuar!”
“É algo complicado e difícil, mas ao mesmo tempo gratificante. É difícil lidar com diferentes pessoas, conforme suas curtidas, RTs, comentários e seguidores aumentam tudo vai se complicando. Lidar com um público extremamente dividido, como o do K-Pop, é a parte mais trabalhosa.” Comenta a Update Kgirls.
“[…]A gente gosta muito de ver as reações das pessoas, e ficamos muito felizes quando elogiam nosso trabalho, principalmente por ser algo 100% voluntário que nós fazemos por amor mesmo, então é muito bom quando interagem ou dando um like, ou elogiando a gente, ou conversando com a gente. Gostamos bastante disso.” Conta a Jamie Brasil “Acreditamos que ser amigável como alguém que “repassa” conteúdo é diretamente ligado a como esse artista vai ser reconhecido? Aquilo de fã legal artista legal. Também é bom ter essa conexão mais direta com os fãs porque nos ajuda a saber como nós podemos nos aproximar deles e fazer um conteúdo que seja mais confortável de consumir, menos robótico ou automático.”
Inclusive, o termo “robô” é bem comum no meio.
Como a Nct Brasil também cita : “Por trás das traduções e dos projetos sempre tem uma equipe que dedica seu tempo[…] Muitas vezes as pessoas acham que somos robôs kkkk mas somos apenas fãs que adoram compartilhar e tornar acessíveis os trabalhos dos nossos favs, então sempre valorizem as fanbases e deixe um comentário, like e sempre seja gentil!”
E a Update Kgirls também cita o termo: “A cobrança é ENORME e nem sempre é com educação. Já dissemos isso diversas vezes por lá, não ganhamos absolutamente nada, fazemos por gostar e como forma de lazer[…] Sempre tenho a impressão que alguns ignoram que somos fãs e temos nossos gostos pessoais. Mesmo tentando ao máximo não misturar nossas opiniões pessoais com a UK, às vezes acontece, pois não somos robôs.”
A Update KGirls, como um portal, conta mais sobre a interação com o público e a visão do público com essas páginas:
“[…]É difícil sempre entregar as várias informações que saem em um dia, elas saem de madrugada, de manhã, de tarde, de noite, mas você não está 24 horas online e boa parte disso pode passar despercebido, mesmo assim, você será julgado se não postar sempre TUDO na hora. Nós já erramos muito e não ignoramos várias dessas situações que somos julgados até hoje por elas. Mas faz quanto tempo? Cinco meses? Dez meses? Um ano? Dois? Não importa. Você ainda vai ser a mesma pessoa que era ontem para pessoas ignorantes. A comunidade do K-Pop é extremamente hipócrita, isso fica claro na forma como as fanbases são tratadas.”
O trabalho de fãs construíram o que temos hoje. O respeito é necessário, não somente com as fanbases e fansubs, mas entre a comunidade em si. Por favor, mantenham isso em mente.
Esta pauta é um grande “Obrigada” para todas as pessoas que se dedicam para compartilhar aquilo que amam!
Antifeminismo na Coréia do Sul: Apenas Mais um Caso Isolado?
Indiretamente relacionado a um caso de estupro seguido de morte, assumidamente antifeminista e autor da frase: “As mulheres estão propensas a sofrer mais crimes sexuais.